O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá decidir em julgamento se é constitucional a aplicação de multa ao motorista que se recusa a passar pelo exame do bafômetro. A lei prevê que a ação é considerada infração de trânsito, mas é questionada na Corte em matéria de repercussão geral, ou seja, que será válida para todos os processos sobre o tema.
O ministro Luiz Fux, relator do caso, apontou que o caso extrapola os interesses entre o condutor e o Detran devido à relevância do ponto de vista econômico, político, social e jurídico da questão. O ministro destacou que o debate envolve garantias individuais relativos à liberdade de ir e vir, presunção de inocência, autoincriminação e princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
O caso será julgado pelo plenário virtual do Supremo, ferramenta que simula o plenário físico e no qual os ministros decidem remotamente sobre os processos.
Em segunda instância, a justiça do Rio Grande do Sul anulou a multa aplicada ao motorista que moveu o processo por considerar que, não havia sido constatado que ele conduzia o veículo sob efeito de álcool, não deveria haver uma infração de trânsito pela recusa ao soprar ao bafômetro.
Os desembargadores apontaram que, segundo o Código de Trânsito Brasileiro, a recusa só produz multa caso o motorista apresente sinais externos de influência de álcool e características que apontem embriaguez – tudo isso perante uma testemunha. A decisão de segunda instância apontava que, no caso em discussão, a mera recusa em soprar o bafômetro não qualificaria o motorista como potencial ameaça à segurança do trânsito.
O Departamento de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran-RS) recorreu da decisão, alegando ser razoável e proporcional a aplicação de multa a quem se recusa a soprar o bafômetro e que o direito fundamental da coletividade à vida e à segurança do trânsito não deve ser confrontada pelo direito individual de liberdade.
Arbitrariedade
No caso dos autos, a Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul anulou auto de infração de trânsito lavrado contra um condutor que se recusou a fazer o teste do bafômetro. De acordo com a decisão, como não havia sido constatado formalmente que ele conduzia veículo sob sinais externos de uso de álcool ou de substância psicoativa, não há infração de trânsito.
Segundo a Turma Recursal, a lógica da regra, prevista no artigo 165-A do CTB, é a de que só é possível autuar o condutor que se recuse a realizar os testes caso ele apresente sinais externos de influência de álcool, com todas as características de embriaguez devidamente descritas e na presença de testemunha idônea. Assim, a autuação de condutor que não apresente ameaça à segurança no trânsito pela mera recusa em realizar os testes oferecidos pelos agentes de trânsito configuraria arbitrariedade. O acórdão considera que a regra do CTB é inconstitucional, pois viola os princípios da liberdade (direito de ir e vir), da presunção de inocência, da não autoincriminação e da individualização da pena.
Segurança
No recurso apresentado ao Supremo, o Departamento de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran-RS) argumenta que a constitucionalidade do artigo 165-A do CTB não pode ser afastada com fundamento no direito individual de liberdade quando confrontado com o direito fundamental da coletividade à vida e à segurança do trânsito. Sustenta, ainda, que a imposição da penalidade administrativa de suspensão do direito de dirigir a uma pessoa que se recusar a realizar o teste do bafômetro, impedindo a fiscalização de trânsito de constatar se ingeriu álcool, é razoável e proporcional.
Ainda segundo o Detran-RS, como a infração é administrativa, não procede a alegação de ofensa ao princípio da não autoincriminação e a outros direitos e garantias individuais relacionados ao Direito Penal. Também alega que, como se trata de infração autônoma, não se exige do agente fiscalizador a comprovação de sinais de embriaguez, bastando a recusa do condutor.
Garantias individuais
Em manifestação no Plenário Virtual, o ministro Luiz Fux, relator do recurso, observou que a controvérsia constitucional ultrapassa os interesses das partes, por sua relevância do ponto de vista econômico, político, social e jurídico. Segundo ele, embora seja conhecida a preocupação do legislador em dar tratamento mais austero aos condutores que, sob a influência de álcool ou de outra substância psicoativa, exponham a perigo os direitos à vida, à saúde e à segurança no trânsito, a discussão sobre a constitucionalidade do artigo 165-A do CTB tem potencial impacto em outros casos, tendo em vista a atuação dos órgãos de fiscalização integrados ao Sistema Nacional de Trânsito.
Fux salientou a relevância da questão, sobretudo em razão da argumentação de violação aos direitos e garantias individuais relativos à liberdade de ir e vir, à presunção de inocência, à não autoincriminação, à individualização da pena e aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Do ponto de vista constitucional, destacou especialmente a discussão sobre a declaração de inconstitucionalidade de dispositivo de lei nacional.
O Estado de S. Paulo e STF